Um poema para essa sexta-santa

Estes tempos de pandemia são prosaicos, mais lentos e um tico aborrecidos. As notícias se repetem e qualquer roda de conversa versa a respeito do invisível… enfatizando a nossa proximidade com o vírus. Se em um tempo anterior, os números eram somas impossíveis-estranhas-distantes — os nomes de pessoas próximas-conhecidas-parentes-amigas se agigantam numa lista que não queremos fazer.

Eu acusei cansaço em vários momentos… Fechei os olhos e fiquei quieta no aconchego de versos que trago comigo para momentos de horror — de Cecília Meireles a josé luís peixotto, entre tantos outros.

No mês passado se comemorou o dia internacional da poesia… É bastante comum alguém me perguntar como vou comemorar a data. Nesse ano, passou em branco. Ninguém se lembrou. Acho que a maioria de nós está alheia ao calendário. Eu parei em março do ano anterior e tenho (confesso) alguma dificuldade em avançar nos dias e chegar ao tempo presente. Não se trata de fuga… é apenas confusão de dias-semanas-meses, como se estivesse sentada à mesa para um jogo de cartas. Vejo as mãos do mio nonno separar dois montes de cartas, reunindo-as num movimento de dedos. Ouço o estalar das cartas se encaixando e pronto, ele as arremessa — de maneira certeira — aos participantes. Minha mão não é das melhores. Resta-me o blefe… que não convence a mim, muito menos a você que me lê.

Para essa sexta (feriado na cidade e no calendário) fui a prateleira e escolhi poetas para esse Abril. Tentei evitar Eliot porque sua poesia esta a me perturbar nesse ano de desaforos políticos (anunciam-se aqui e ali — nada de novo no fronte —, as tentativas de golpes) e os poemas do homem inglês narram uma terra devastada

Escolhi Ana Luísa do Amaral e comecei o dia de sol e nuvens — muito mais nuvens que sol —, com feitos de lava, uma sequência de oito poemas a partir da página 15 do livro vozes. Transcrevo o primeiro abaixo para quem gosta de poesias — tenho plena consciência que a maioria prefere ficção à poesia. E há quem afirme sem constrangimento e em voz alta… que o gênero pouco lhe diz. Eu acredito que seja porque ainda não encontraram um poema-poeta estetoscópio. Sugiro que insistam e não cessem a procura… Em algum momento certamente um poema será o tuo próprio cuore a pulsar…

1.

Há de ter sido assim:
o princípio do mundo
— antes de os grandes sáurios
invadirem o chão
e os céus

Muito antes
da súbita explosão
que lhes pôs fim

Há de ter sido assim:
um caldo borbulhante
e os veios roxos,
entre azul e lilás,
a rocha
negra        negra         negra

— e cor
de fogo.

Abril [entre tantas coisas] é o mês do B.E.B.A e lá vamos nós…
e eu terei companhia nessa aventura diária

Adriana Aneli – Alê Helga – Claudia Leonardi – Darlene Regina
Mariana Gouveia – Obdulio Nuñes Ortega – Roseli Pedroso

Publicado por Lunna Guedes

Sou sagitariana. Editora de livros artesanais. Autora de romances. Degustadora de café. Uma típica observadora de pássaros, paisagens, pessoas e lugares. Tenho fases como a lua... sendo a minguante a minha preferida!

19 comentários em “Um poema para essa sexta-santa

  1. Tenha um ótimo e feriado e vamos nos esquivando em busca da vacina perdida…Sou um dos que não gosta de poesia, e olha que já tentei. Não faz sentido pra mim, mas bem que eu queria ter este outro olhar, creio que seja um novo mundo que se abre ao se deixar gostar da mesma. Infelizmente não é pra mim!

    1. Parece ficção a nossa realidade e pior que por mais que eu tente ser otimista, não vejo luz no fim desse túnel.
      Enfim, vamos sobreviver. E no meu caso, irei recorrer a poesia.
      Eu conheço muitas pessoas que não gostam de poesia… e já ouvi muitas justificativas mas é a primeira vez que alguém me diz que “infelizmente não é para mim”. Acho que prefiro esse corte definitivo. rs

      bacio

  2. Não comemorei especificamente a Poesia nos dias que estipularam, já que ela me assalta dia sim, o outro, também. Belo trecho o que escolheu, Lunna! Mais uma poeta para pesquisar.

  3. Também resolvi começar o mês com poesias! Poesias que falem de amores, de flores, ventos, vida…Escolhi O Amor nas 4 Estações de Victor Degasperi

  4. Sempre que leio algo dela me vem a memória Lua de Papel e isso é por tua causa.
    Suspiro aqui… o teu texto me representa sempre!

Pronto para o diálogo? Eu estou (sempre)

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