…sentei-me aqui, nesse fim de tarde-começo de noite (fria) de outono, para responder uma missiva que há dias queima em minhas mãos. As palavras flutuam por dentro, como de costume. Mas não deixam o invólucro… porque preservo alguns pequenos hábitos. Eu preciso ser noite, xícara de chá, silêncio, folha de papel, envelope e selo ao escrever uma missiva. É dessa forma que insiro uma espécie de pausa na realidade insistente e em meu imaginário sempre tão agudo e pulsante… o que me permite saborear o precioso instante de silêncio em que posso ouvir o som do meu cuore badalar reticências… repetindo Tarsila, que em suas missivas dizia: ‘aí vai o mio cuore’…
Preciso que o meu corpo anoiteça e que o som da chaleira se faça presente… ressoando sonoro pelos cantos da casa, me permitindo uma ilusão confortável de futuro — a única que eu aceito — através da infusão do chá. Escolho o lugar… o canto do sofá ou a mesa na varanda. E já não dependo mais das manhãs de sábado para escrever, como antes. Mas, as respostas ainda surgem no exato instante em que a leitura acontece. Só não chegam ao papel com a mesma velocidade. E ainda sou dependente de folhas de amarelecidos tons, tanto quanto dos envelopes coloridos — sendo uma cor para cada correspondente, que já não são tantos.
Também não existe mais a questão da espera e confesso que sinto falta disso. Era delicioso passar pela caixa de correspondência, no portão de casa, com a ansiedade típica de uma criança em véspera de natal. Como eu gostava de ser surpreendida com certos envelopes. Admirar a caligrafia azul-preta ali desenhada. Apreciar o meu nome grafado, e sentir a textura do papel bem dobrado. Adorava imaginar os caminhos percorridos até as minhas mãos…
Eu tive muitos correspondentes… e me lembro de cada um deles. É um curioso desfile de personagens, com histórias restritas aos envelopes e papéis de cartas. Curioso… são como livros! Possuem uma narrativa bem definida… com o tradicional: começo-meio-e-fim.
Nesses tempos modernos, as missivas dispensam carteiros, caixas de correspondência, envelopes, selos e papéis. Chegam rapidamente através do e-mail ou de um post em um blogue. Não me aborreço com a modernidade… mas sinto falta da ‘espera convertida em surpresa’.
Abril [entre tantas coisas] é o mês do B.E.B.A e lá vamos nós…
e eu terei companhia nessa aventura diária
Adriana Aneli – Alê Helga – Claudia Leonardi
Mariana Gouveia – Obdulio Nuñes Ortega – Roseli Pedroso
Recebi poucas cartas em minha vida. Mas poucas que estiveram em minhas tiveram realmente esse dom de nos surpreender. Principalmente porque alguém se predispôs a pegar papel e caneta e expressar ideias, sentimentos, emoções, histórias para nos tocar com suas palavras…
Eu sempre me surpreendia ao receber uma resposta. Era um sentimento único e poderoso. Eu o preservava em mim.
Também sinto falta das correspondências e postais que recebia. Era um mundo que descortinava através da leitura dessas cartas trocadas.
Seu post me lembrou uma época tão gostosa da minha vida…Quando adolescente eu trocava muitas cartas com minhas amigas, mas a gente não enviava pelos Correios e sim entregava direto uma pra outra, hahaha. Muitas vezes eram as mesmas frases feitas de sempre, mas tinha um empenho muito forte na escolha do papel, caneta e outros itens que decoravam, como adesivos e afins. Preciso acha-las pra relembrar isso tudo!
Seja enviada ou entregue, é bom demais ler as palavras de alguém querido, né?
Se eu disser que volta e meio ainda beijo essa carta?