Existe um lugar nas minhas lembranças onde é sempre verão… e tem uma casa com seus cômodos grandes, o piso da cozinha é vermelho-chão, e da sala e dos quartos são laminados de madeira que rangem ao passar dos passos. Tem um carrilhão preso no meio de uma parede que canta lá pelas oito da manhã e o velho casarão reage junto. Um velho homem cheio de histórias para contar, faz resmungar os ponteiros, todas as manhãs, pontualmente as oito horas. Até ele morrer, eu acreditava que dependia daquele gesto-matinal para o tempo passar. Não fosse isso, estaríamos aprisionados por toda a eternidade, dentro do mesmo instante. E eu não estava totalmente errada porque depois da morte daquele homem, o tempo nunca mais foi o mesmo, nem o velho carrilhão, que não voltou a cantar.
A minha família era numerosa — uma bela mistura de povos gregos, romanos e etruscos, entre outros tantos. Tinha de tudo um pouco. Uma gente de pele avermelhada, corpos grandes e sorrisos largos.
As refeições mais agradáveis eram as improvisadas… alguém estendia a toalha por cima da mesa e os rituais de talheres e pratos se cumpriam um a um. A nonna escolhia os ingredientes. Nas noites de sextas — celebrando a nossa chegada — ela servia caldo de massa e eu que não era de muito comer, repetia duas-três vezes. Tinha um sabor especial de mesa cheia, carinho dos meus — ingredientes essenciais. Era um prato bem simples. Tomates da horta do quintal, alho picado e dourado no azeite e farfaline.
E as tardes mornas de sábado, quando a gente observava a paisagem de nuvens e promessas de chuvas intensas, a nonna dizia: que vontade de fazer pães e lá íamos nós para a cozinha.
Na tigela, a nonna despejava o trigo peneirado, açúcar, sal, leite, água, manteiga… e mão na massa. Eu adorava acompanhar o processo. Ver os ingredientes ganhar forma, mudar de cor e desgrudar dos dedos.
Ela não tinha um desses cadernos-livros de receitas. Tudo que fazia era a partir dos ingredientes. O mais importante — dizia ela, com sua voz de nonna —, é o sentimento na hora de mistura-los. Levei algum tempo para compreender a magia de que sou feita.
Tantos anos depois, eu entendo a vontade de fazer pães gritando pelos cantos do corpo — aliando-se a certas memórias. A procura por ingredientes no armário e o jeito certo de sovar a massa Tudo isso me acalma, me alegra e me leva de volta para o verão da minha infância, esse lugar que é abrigo para se chegar-ficar e sentar-se à mesa para provar de uma fatia de pão recém-saído do forno, com manteiga derretida.
Agosto [entre tantas coisas] é o mês do B.E.B.A
e eu terei companhia nessa aventura diária:
Mariana Gouveia – Obdúlio Nunes Ortega – Suzana Martins
Darlene Regina – Mãe Literatura – Alê Helga – Roseli Pedroso
Sempre sinto presença de sua nonna quando tu diz: vou fazer pão… é como se ela estivesse junto com a gente, mesmo eu estando em lugar diferente do seu. E acredito muito que ela esteja.
Acho que amanhã farei pão em homenagem a ela.
Pois é, sinto o mesmo cara mia. Aprendi com ela essa frase. Quando tudo falha, faça pão. Quando tudo acontece, faça pão. E adorei preparar uma fornada para tu
E eu fiquei aqui a lembrar do sabor do teu pão. Que delícia!!!
perfumou saudades por aqui…