* Como posso viver sem essa mulher que funciona como o meu espelho?

* Rozana Gastaldi Cominal (Mulheres que voam)

Peguei um livro na prateleira pouco depois do almoço… “inéditos e dispersos”… de Ana Cristina Cesar que é uma figura múltipla. Sua poesia é a sua biografia… É a sua roupa suja, a mesa com restos das refeições feitas. É o corpo depois do sexo. A pele a cicatrizar cortes acidentais.

Eu gosto de dialogar com ela. Sentir as suas palavras em mim. Mas me incomoda o rótulo imposto à sua escrita como se fosse uma espécie de verdade única e imutável. Dizem-na poeta marginal… Eu pouco ou nada entendo de rótulos. Gosto de Poesias… e isso me basta.

Descobri a poeta Ana C., através de Emily Dickinson. Soube que ela havia traduzido cinco poemas da poeta estadonidense e inaugurei a minha pesquisa. Não foi nada fácil encontrar os tais versos.

Fui lendo tudo o que encontrei e a cada verso lido, percebia uma espécie de resposta endereçada à poeta de Amherst. Ana C., convidava Emily para um diálogo de fim de tarde, num desses cafés aconchegantes, espalhados pelas muitas esquinas do mundo. Sentadas diante uma da outra, separadas por essa pequena bobagem temporal, aprendiam-se através dos discursos entregues ao papel.

Todo escritor têm os seus pares. Eu encontrei em Jane Austen — escritora inglesa — uma espécie e eco para os meus anseios. Escrevi cartas, deixei bilhetes dentro de seus livros e quando tenho dúvidas criativas, recorro a narrativa a mulher-romancista-inglesa.

Ao pesquisar Ana C., soube de sua morte, em 1981 — ano de meu nascimento. Ela se despediu da vida através de um voo. Condição de pássaro. Braços abertos. O corpo em queda livre depois de um salto. A realidade e seus excessos, abandonados. O imaginário lhe estendeu as mãos e disse: no três. E ela saltou. Deixando para nós, todas as suas formas de silêncio…

eu não sabia que virar pelo avesso era uma experiência tão mortal — ao ler esse poderoso verso, reconheço todos os que ela leu e me deparo com um reflexo no espelho, onde minha imagem se fragmenta: Virginia, Simone, Mariana, Roseli, Suzana, Rozana, Jane, Louise, Ana, Wislawa… e tantas outras.

Ana C. pertence a uma categoria de mulheres raras, que deixou um rastro, onde encaixar o nosso passo e, ao seguir adiante, continuamos até que outra assuma o caminhar…

Nesse novembro [entre outras coisas] vamos de #blogvember…
Aventuram-se em linhas diárias: Mariana GouveiaObdulio Nuñes Ortega,
Suzana Martins Roseli Pedroso

Publicado por Lunna Guedes

Sou sagitariana. Editora de livros artesanais. Autora de romances. Degustadora de café. Uma típica observadora de pássaros, paisagens, pessoas e lugares. Tenho fases como a lua... sendo a minguante a minha preferida!

6 comentários em “* Como posso viver sem essa mulher que funciona como o meu espelho?

  1. Vim ler voando! E como estou?: “eu não sabia que virar pelo avesso era uma experiência tão mortal —”. Você sabe nos instigar, Lunna!

Pronto para o diálogo? Eu estou (sempre)

Preencha os seus dados abaixo ou clique em um ícone para log in:

Logo do WordPress.com

Você está comentando utilizando sua conta WordPress.com. Sair /  Alterar )

Imagem do Twitter

Você está comentando utilizando sua conta Twitter. Sair /  Alterar )

Foto do Facebook

Você está comentando utilizando sua conta Facebook. Sair /  Alterar )

Conectando a %s

%d blogueiros gostam disto: