Amigo Secreto

E chegamos a famosa época do ano em que se sorteia os amigos secretos nas escolas, empresas, casas… onde tiver um grupo de pessoas animadas e dispostas. Trata-se de uma brincadeira dentro dos dias de dezembro. Mas, às vezes, algo dá errado e a coisa não acaba bem. Eu participei de alguns — quando não tive como escapar. Foi o que aconteceu no meu último ano de Faculdade. E eu sou péssima em comprar presentes quando obrigada. Não sei o quê, como, quando escolher.

Mas se tem uma coisa que eu gosto é de compreender como certas coisas surgiram. Eu não chamo de história. Para mim são lendas porque vamos combinar que os fatos não são históricos, são narrações privilegiadas de uns e outros.

E segundo reza a Lenda… o ano era 1072 d.C. e lá pelas bandas da gélida Escandinávia uma brigada de soldados vikings se encontrava entrincheirada, aguardando pelo momento de realizar uma investida contra o exército inimigo.

E em meio à escassez provocada pelo rigoroso inverno… famintos e cansados — tudo o que conseguiram foi uma pequena presa, capaz de saciar apenas um dentre os dez homens famintos.

Como estavam sob efeito do arvak (um destilado semelhante à vodca) consumido em grandes quantidades para espantar o frio… ou como para aliviar o tédio e a permanente tensão — os guerreiros nórdicos inventaram um novo, e para eles, divertido critério para determinar quem iria comer o porco selvagem.

O comandante da tropa escolheu um dos colegas e o descreveu em detalhes. E quem desse o palpite errado… receberia um soco na cara de quem estivesse à sua esquerda. E aquele que descobrisse o soldado secreto… comeria o porco. Mas, caso o soldado descrito acertasse o próprio nome, deveria matar o homem que propôs o desafio.

Por razões óbvias, a brincadeira foi adaptada para os dias atuais, evitando socos e mortes… E mesmo assim, essa inofensiva brincadeira ainda pode acabar muito mal. Eu coleciono algumas histórias trágicas a respeito. Atire a primeira pedra quem nunca passou por situações constrangedoras e hilárias… durante a revelação do amigo secreto.

O que eu participei no último ano de Faculdade… ficou decidido que só poderíamos dar chocolates de presente. Eu comprei uma caixa de bombons sortidos porque não conhecia o sorteado. Eu não participava das atividades coletivas da turma e desconhecia a maioria dos meus colegas. O meu presente, no entanto, foi motivo de discórdia. A maioria optou por comprar um chocolate pequeno, quando muito uma barrinha. E eu comprei uma caixa inteira de bombons. Os ruídos se espalharam… pareciam abelhas zangadas. O meu amigo secreto — revelado — no entanto, pareceu feliz com o mimo.

Fiz a minha parte e me desliguei da realidade. Não reparei nas palavras ditas por uma das minhas professoras. Só dei atenção quando começou o alarido. Todos os que foram apontados, estavam errados. Ouvi as suas palavras finais: o meu amigo secreto me disse durante uma conversa: primeiro estranha-se e depois entranha-se. Eu me acomodei na cadeira, cruzei os braços à frente do corpo e sorri. Trocamos olhares e ela estendeu o presente em minha direção. Ganhei um abraço demorado e uma frase inteira: foi um prazer ser sua professora. Eu emudeci… não queria desembrulhar o pacote, mas todos queriam saber qual chocolate ela havia escolhido.