O homem; as viagens

Cara Heloísa,

Escrevo-te nesta manhã dourada de sol, céu azul e temperatura agradável. Uma brisa fria agita a cortina e anuncia os últimos dias de Primavera. Nunca foi tão difícil compreender as estações do ano nesta cidade, como agora. Tudo é excesso: do calor ao frio. E dizem que será assim daqui para frente graças às nossas atitudes irresponsáveis.

Quando criança, ouvia falar em efeito estufa e nos buracos da camada de ozônio. Assistia filmes a respeito do fim do Planeta Terra. Mad Max era o pior de todos. Eu preferia os que diziam que um meteoro iria colidir contra a Terra, por mais que a ideia parecesse improvável. O que eu estudava nas aulas de biologia deixava bem claro que não seria possível tal coisa. Mas as histórias eram interessantes. Cientistas em busca de solução para evitar o nosso fim. E eis que um deles, em pleno século XXI — que se mostrou bem diferente das ficções da minha infância — nos manda desistir do Planeta, por ser tarde demais. Ao ouvi-lo, resirei fundo e me lembrei de Drummond.

O homem, bicho da terra tão pequeno
Chateia-se na terra
Lugar de muita miséria e pouca diversão,
Faz um foguete, uma cápsula, um módulo
Toca para a lua
Desce cauteloso na lua
Pisa na lua
Planta bandeirola na lua
Experimenta a lua
Coloniza a lua

Civiliza a lua
Humaniza a lua.

Eu me apaixonei por esses versos e me aborreci com o tal cientista, declarado Bufão a partir disso. Exaltado por acadêmicos e pessoas várias. A criatura em sua genialidade humana — o que para mim já seria motivo de contestação — nos manda desistir do lugar onde tudo, desde o primeiro segundo, tornou possível a nossa existência.

Durante os anos escolares e os estudos das estrelas… uma pergunta ressoava em meu íntimo: o que teria acontecido de tão especial e em que momento isso teria acontecido, tornando possível a vida na Terra? Ficava a imaginar o Big Bang — minha teoria favorita, que combinava com o que dizia a Mitologia Grega. O universo se encolheu tanto que explodiu. Teria sido nesse instante em que alguma coisa diferente aconteceu? Gosto de acreditar nessa possibilidade… que faz de nós: tudo e nada. Num instante, não há nada, apenas o vazio, o silêncio. E no outro… a ideia para um verso, uma linha inteira e pronto.

Há pessoas que acreditam em divindades e seus gestos são orientados por regras divinas incontestáveis. A única coisa divina para mim, é a vida: minha-sua… dos outros, de um pequeno inseto, de um cachorro, de uma farfalla em seu último vôo… E tudo isso tem fim porque somos feitos de uma mesma matéria: a vida que começa e termina em um sopro.

Enquanto se discute tantas bobagens por aí, o essencial se perde. Precisamos de ar… para o primeiro e para o último instante de vida. Quando tudo em nós para, o mundo continua a girar e todas as outras formas de vida continuam…

A Natureza nos mostra cada um de seus muitos ciclos: fases lunares, estações do ano e tantos outros. Tenta nos ensinar que é preciso respeitá-la… e as suas muitas formas-fases. Mas a nossa genialidade não permite… Esqueçam a terra, disse o homem, é tarde demais para este Planeta. E eu o ignoro, prefiro mesmo o poeta-homem Drummond e seus poderosos versos.

Lua humanizada: tão igual à terra.
O homem chateia-se na lua.
Vamos para marte — ordena a suas máquinas.
Elas obedecem, o homem desce em marte
Pisa em marte
Experimenta
Coloniza
Civiliza
Humaniza marte com engenho e arte.

Marte humanizado, que lugar quadrado.
Vamos a outra parte?
Claro — diz o engenho
Sofisticado e dócil.
Vamos a vênus.
O homem põe o pé em vênus,
Vê o visto — é isto?
Idem
Idem
Idem.

Au revoir

Publicado por Lunna Guedes

Sou sagitariana. Editora de livros artesanais. Autora de romances. Degustadora de café. Uma típica observadora de pássaros, paisagens, pessoas e lugares. Tenho fases como a lua... sendo a minguante a minha preferida!

Um comentário em “O homem; as viagens

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