A guerra de todos contra todos

Cara leitora de Direita,

Escrevo-te porque o meu silêncio parece chegar a você — em ondas — como se eu concordasse com suas falas ao vento. Eu nada tenho contra conservadores e pessoas que escolhem a Direita como caminho para os seus pés. Ainda que considere uma estupidez — ignorância talvez — o passo apressado por vias esburacadas, enquanto o galardão é carregado por um bem cuidado tapete cinza em sua liteira dourada… sem olhar o que atropela-mata-descarta.

Eu me lembro que ao estudar história, fui apresentada ao conceito de Direita e Esquerda… E lá fui eu o navegar pelas páginas da velha enciclopédia. Descobri que o parlamento francês era dividido em dois grupos: os Girondinos que eram contrários às mudanças, favoráveis aos privilégios de certos grupos, dentre eles, a igreja e a burguesia e se sentavam à direita. E à esquerda estavam os Jacobinos, simpatizantes da revolução, das mudanças e defensores dos direitos trabalhistas…

Ao final de minhas leituras… me posicionei à esquerda. Tive um nonno atuante na resistência italiana e que esbravejava contra as idéias da Direita, que ele afirmava ser hábil em repetir o mesmo discurso, como se fosse um jargão: “somos contra a corrupção“… para arregimentar asseclas. E funcionou… disse, ele.

Foi a Direita que impôs ao mundo suas teorias nazi-fascistas que seguem dando frutos. O nonno dizia à mesa que precisavamos dormir com um dos olhos abertos. O fascismo não havia desaparecido. Estava adormecido — se fingindo de morto.

O fascismo — ao contrário do que dizem por aí — não é uma invenção de Bento Mussolini. É uma arquitetura nossa — minha-sua e todos os seres humanos. A palavra foi cunhada apenas para facilitar o discurso contra a corrupção, a favor da família e dos valores… Tudo isso para evitar a palavra que nos desgraça: preconceito, que é a base de tudo isso.

Em pleno século XXI ainda nos ocupamos da vida alheia. Você disse: se trata do que é certo e errado… Ou seja, é a necessidade de estar sempre certo e gritar para o mundo que o outro está errado. A minha opinião prevalecer sobre a sua e vice-versa.

Disse há pouco para uma amiga-escritora que sinto preguiça de ter opinião… E acuso cansaço de apresentar o que penso a respeito do mundo-atual para pessoas como você — de Direita e conservadoras porque é perda de tempo. Os argumentos são rasos e mentirosos.

Sim, eu sou de esquerda e escolho o que apoiar-acreditar. Não digo amém para todas as coisas e não tenho heróis que possa aplaudir. Gosto imenso de revoluções e das pessoas que insurgem com discursos contrários. Sou feminista e defendo o aborto; a mulher ter ou não filhos, ser esposa de um homem ou de uma mulher. Sou a favor dos direitos humanos e de grupos como o MST.

Você prefere defender latifundiários e empresários por considerá-los os grandes arquitetos desse país. É preciso fechar os olhos para não perceber que esses senhores invadiram terras, derrubaram árvores, sujaram águas e tiraram proveito da mão-de-obra barata…

Posso ouvir o seu pensamento esbravejando daqui a sua cisma-picuinha: comunista… Eu costumava rir quando essa palavra era atribuída a mim. Parei ao perceber que quem a proferia, desconhecia a história do mundo e do próprio país que optou pela escravidão desde a chegada do primeiro português em solo tupiniquim.

São Paulo, a mais importante cidade do país, ergueu-se… pisando em povos africanos-europeus-asiáticos — enganados com falsas promessas. Eram meros substitutos. Mais tarde vieram os nordestinos e outros povos locais para dar continuidade a construção de suas torres. Hoje, se estendeu os limites para os povos latinos…

É disso que se trata a Direita… e é isso que se pretende manter-alimentar. O caminho cinza-liso sem desvios ou buracos para meia dúzia, conduzida em literias. Quantos ricos existem no país? Dá pra contá-los e apontá-los numa lista. Quantos sobrevivem das esmolas dadas por esses senhores? Esse é o sistema pelo qual luta com garras afiadas… 

E se eu lhe escrevo, não é para convencê-la a mudar de lado. Eu não tenho ânimo para isso. Há coisas que ocupam lugares no mundo para que pessoas como eu, possam entender o sentido da marcha.

Escrevo-te apenas para afirmar o que já sabe: estamos em lados opostos, na história. A minha luta é outra… Não é contra a corrupção — esse fantasma que o nazi-fascismo prometeu combater num discurso velho e gasto que ainda convence em 2023…

Eu luto por pessoas — uma causa que considero justa. E faço o que posso… não tenho ilusões ou planos-projetos. Alinho-me com pequenos grupos e suas batalhas. Nada grandioso porque eu tenho a disposição de uma formiga. Os que me conhecem, sabem que eu preciso de resultado. Eu gosto imenso de caminhar e encontrar uma pequena folha no meio do caminho esburacado que, às vezes, alaga, sofre com deslizamentos e perdas… É difícil, cansativo e, vez ou outra, o desanimo surge quando pequenas conquistas nos são subtraídas. Mas sempre acontece alguma coisa: ninguém solta a mão de ninguém.

Eu nunca tive a intensão de chegar a algum lugar — gosto mesmo é do trajeto… E não se engane, eu tenho consciência de que somos imperfeitos e cometemos erros. Mas só não erra, quem não tenta e se mantêm à Direita.

Por isso, a minha marcha é a sua Esquerda! 
Sem mais, 

Comunia est tumor peblis timor regni, tepor sacedotti

Publicado por Lunna Guedes

Sou sagitariana. Editora de livros artesanais. Autora de romances. Degustadora de café. Uma típica observadora de pássaros, paisagens, pessoas e lugares. Tenho fases como a lua... sendo a minguante a minha preferida!

7 comentários em “A guerra de todos contra todos

  1. Eu acho estranho, Lunna que essa gente de direita perdeu a vergonha e se sente confortável para dizer o que pensa. Antes era meio constrangedor falar: sou de direita. Mas isso foi mudando porque as pessoas se cansaram do discurso bem-comportado. Impressão minha, claro.
    As pessoas se dizem conservadoras e falam em costumes e valores. Quando nada disso é novo, mas para elas parece ser. Na escola eu já havia estudado sobre os conceitos da Idade média e que reinavam em muitas cabeças. E depois da idéia de “deus acima de todos” que o cristianismo impões.
    Mas eu não entendo como a revolução luterana que fala em direitos humanos virou essa grande bagunça contemporânea.
    Muita gente nem sabe exatamente o que é a Direita, apenas é contrária a esquerda e as cismas (que você mencionou) por medo ou preconceito (as duas coisas) e se uniram e agora são um bando, eu não chamo essa gente de grupo porque não são organizados, apenas estão juntos porque acreditam numa mesma coisa, por enquanto.

  2. A sensação que eu tenho ao acompanhar o bla bla bla cansativo dessa gente de direita é que eles estão vivendo aquele momento: eu não estou sozinho. Outras pessoas pensam igual a mim, ufa. E aí estamos nós com o nosso “ninguém larga a mão de ninguém”. Mas alguém ficou de fora e foi procurar uma sombra, agora estão nessa ilha de iguais.

  3. Belo texto. Sabe, Lunna? Eu penso que a direita oferece o falso conforto e conformismo de um lugar “sagrado” para a mulher. E isso atrai muitas mulheres e fazem com que elas se sintam aliadas e protegidas pelo patriarcado. Mas esquecem que quando te colocam em algum lugar, têm total poder de te tirar dele.
    Deveriam ler the handmaid’s tale e não tratar como mera ficção.

    bj

  4. Eu gostaria de saber o que você ganhou sendo de esquerda
    Mulher que confia na esquerda tem muito que aprender sobre feminismo! Não é uma crítica, só uma reflexão mesmo, pq tô de saco cheio de homem de esquerda se achando a última bolacha do pacote murcho! Pelo menos na Direita temos acolhimento e ninguém se sente melhor que o outro não. É todo mundo com um pensamento igual. Na esquerda tem milhares de ideias e ninguém se entende, mas você vivem dizendo aí que não solta a mão de ninguém. outra mentira da esquerda.

Pronto para o diálogo? Eu estou (sempre)

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