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* não dá para ser perfeito com defeito humano já vem ser: traço falho

* Rozana Gastaldi Cominal (Mulheres que voam)

A história das Mulheres é feita de frases infelizes, ditas por muitos homens, como o modernista Mário de Andrade, que se dirigia a uma poeta mulher, negra e pobre apenas por chamamentos infantis. Era a maneira dele — e não era o único, claro — de diminuí-la e deixar claro que o lugar dela não era na literatura.

Muitas mulheres recorreram a pseudônimos masculinos para serem publicadas. São conhecidos casos de autores elogiados pelos acadêmicos, que se soubessem ser alcunhas para Mulheres que escrevem, não teriam se dado ao trabalho de ler, quiçá de elogiar. Há casos de escritoras que foram aceitas, por escrevem tão bem quanto os homens, fato que causava estranheza em certos senhores.

Várias mulheres perderam oportunidades porque a literatura não era lugar para elas

Mas onde seria esse lugar? Nessa semana, a jornalista da GloboNews, Eliane Cantanhêde fez questão de deixar claro que não entendia a presença de Janja — mulher do presidente eleito –, em um lugar, que não era o dela.

Na tentativa de se justificar, repetiu as falas conhecidas: fui mal interpretada. não foi isso que eu disse, minha fala foi tirada fora de contexto. E, quando a presidente do PT, Gleisi Hoffmann a acusou de machismo, enfatizou que o feminismo está no seu DNA.

Acusei cansaço no meio da tarde de sábado e vim para cá, ler poesias e limpar a mente de certos “atos falhos”. E comecei a escrever esse texto, recordando conversas tantas… No momento em que o comentário foi feito, estava diante da televisão. Rosnei e levei minha xícara de café para a varanda. Alguns jornalistas — homens ou mulheres — deveriam admitir o erro-falha de seus comentários infelizes, como o fez, ainda que com algum atraso, Mário de Andrade.

Todos nós corremos o risco de dizer bobagens preconceituosas: usar palavras erradas ou termos impróprios. Somos parte do meio e fomos educados com a ideia de que a Mulher precisa saber se comportar. Mantenha as pernas fechadas. Prenda a sua cabrita porque o meu bode está solto — são frases conhecidas e repetidas a exaustão.

Somos culpadas-apontadas quando algo nos acontece. E somos nós quem devemos estar sempre atentas. Os homens não são responsáveis; são eternos meninos e não importa a sua idade: vinte-trinta-quarenta. A velha máxima se mantêm. E como não mentem — de acordo com eles próprios — é a palavra dele contra a de uma mulher, figura ardilosa, disposta a acabar com a reputação de um bom homem.

Lembro-me do caso João-de-deus. A primeira denúncia feita contra ele partiu de uma menina de 16 anos, que foi ignorada e humilhada por adultos que deveriam protegê-la. Tudo poderia ter Fim ali. Mas era a palavra de um Homem admirado, um curandeiro-farsante, contra a de uma menina. Quantas vítimas precisaram existir para que o homem de bem fosse acusado?

No Sul, ocorreu o pior dos casos. A jovem Mariana Ferrer foi agredida duas vezes. Primeiro pelo empresário Thiago Carriço de Oliveira e depois pelo advogado de defesa que a humilhou, expondo-a de forma perversa, sem que Juiz ou Promotor do caso, protegessem a vítima. E para concluir, ele foi inocentado por não ter condições de saber que ela não havia consentido o ato.

Mas, se ela estivesse em casa e não em uma festa. Se não usasse roupa muito curta ou não bebesse. Se não estivesse sozinha. Se estivesse no lugar dela…

Recentemente, o Presidente da República contou uma de suas histórias… alegou ter encontrado meninas venezuelanas numa esquina. Estavam todas arrumadas. Para que? Ganhar a vida. E curioso como de nós-mulheres até a infância é roubada, o direito de ser meninas desaparece quando o olhar de um homem de bem aparece. Afinal, qual era o lugar daquelas meninas de 13 ou 14 anos? O que pretendiam aquela hora da manhã? Vender-se… é a resposta que ele encontrou para justificar sua fala patética.

Em pleno século XXI, ainda precisamos dizer onde é o nosso lugar e aceitar comparações com mulheres que sabiam se comportar, se vestir e, tinha a consciência — por serem educadas para essa finalidade — que por trás de um Grande Homem, existia uma grande-mulher porque sem dúvida, na opinião de algumas pessoas, esse é o unico lugar possivel para a Mulher.

Nesse novembro [entre outras coisas] vamos de #blogvember…
Aventuram-se em linhas diárias: Mariana GouveiaObdulio Nuñes Ortega,
Suzana Martins e Roseli Pedroso

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