Prosa, de Elizabeth Bishop

Fui até a prateleira na primeira hora desse dia. Escolhi Prosa, de Elizabeth Bishop. Não é difícil ler toda a obra de Bishop porque a mulher-poeta-prosadora escreveu pouco. E o livro Prosa reúne todos os textos publicados em Esforços do Afeto, organizado por Robert Giroux…

Considerada uma das mais importantes poetas dos Estados Unidos… a escrita de Bishop tem teor biográfico. Muitos consideram os contos inferiores a sua poesia. Mas o estilo da narrativa nos permite compreender a mulher que escrevia ficção.

A prosa Esforços de Afeto é um longo e detalhado relato de sua amizade com Marianne Moore, responsável por sua incursão pelo universo das letras. A narrativa nos permite saborear a influência da poesia de uma sobre a outra.

As narrativas nos aproximam de Bishop. Primeiras Letras e A ratinha do Campo descrevem a infância da poeta, no Canadá e nos Estados Unidos, marcada pela morte do pai, meses depois de nascer, e pela internação da mãe num hospício quando Bishop tinha apenas cinco anos.

A loucura da mãe ganha protagonismo em A Aldeia com um impressionante grito que se ouve no andar de cima da casa onde vivia a menina Bishop e se espalha por toda a parte a partir da lembrança que o espalha na pele em forma de eco.

Infelizmente O diário de Helena Morley ficou de fora da edição — um equívoco que não deixa o livro que se inicia com o irônico O batismo e surpreende o leitor com o maravilhoso O mar e sua costa… menos interessante.

Faço essa leitura em paralelo ao Poemas escolhidos e Uma Arte. Não nego ser admiradora da poesia de Bishop. Mas, para variar, vou na contramão de quem acredita que a sua poesia é superior. A prosa da autora me conquistou desde o primeiro contato e seduziu pela maneira como a autora construiu as suas frases e pontuou os seus parágrafos. A poesia é maravilhosa, mas é fôlego curto enquanto a prosa é um ritual de chá em cada um de seus pequenos detalhes…

Edwin Boomer levava a vida mais literária que se pode conceber. Nenhum poeta, romancista ou crítico, nem mesmo um que passasse oito horas por dia debruçado sobre a escrivaninha, poderia imaginar a intensidade com que ele se concentrava na vida das letras.
Sua cabeça, na nuvenzinha da luz produzida por sua lanterna, estava sempre dobrada para a frente, enquanto seus olhos vasculhavam a areia ou examinavam as páginas e fragmentos de papel que ele encontrava.
Lia constantemente. Seus ombros eram arredondados, e ele tivera que começar a usa óculos pouco antes de assumir seu cargo.
Os papéis que não lhe pareciam interessantes à primeira vista Boomer jogava dentro do saco; os que ele queriam examinar iam para os bolsos. Mais tarde alisava-os no chão da casa.
(…)

Trecho de O mar e sua costa